Depreciação interfere ou não no cálculo do ganho de capital na venda de ativos no Lucro Presumido

Hoje iremos abordar uma questão que sem encontra omissa na atual legislação do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas e que acaba gerando controvérsias de aplicação prática: Saber se o valor a titulo de depreciação interfere ou não no cálculo do ganho de capital na venda de ativos no Lucro Presumido.

Como se sabe, o regime tributário do Lucro Presumido é onde empresas com faturamento de até R$ 78 milhões apuram o IRPJ através de percentuais pré estabelecidos pelo legislador e que são aplicados sobre a receita operacional do contribuinte. Sabe-se também que os contribuintes aderentes a este regime estão desobrigados de efetuar escrituração contábil (mas podendo fazer se quiser) devendo manter pelo menos o Livro Caixa para evidenciar suas movimentações financeiras.

Já no Regime do Lucro Real o contribuinte está obrigado a efetuar a escrituração comercial. Nesse regime, a apuração de perda ou ganho de capital na liquidação de bens do ativo não circulante, classificados como investimentos, imobilizado ou intangível, deve levar em consideração o valor de venda menos o seu valor contábil, que é aquele que estiver registrado na escrituração do contribuinte, subtraído, se for o caso, da depreciação, da amortização ou da exaustão acumulada e das perdas estimadas no valor de ativos. (Art. 501 e § 1º do RIR/18)

Porém, no regime do Lucro Presumido, o Regulamento do IRPJ dispõe apenas que a apuração ou perdas de ganho de capital nas alienações de investimentos, imobilizados e intangíveis corresponderá à diferença positiva entre o valor da alienação e o seu valor contábil – sem mencionar qual seria a definição de “valor contábil” (Art. 595 e § 1º do RIR/18)

Nesse diapasão é que surge a discussão sobre o qual seria o conceito de “valor contábil” para fins fiscais, que deve ser aplicado ao ganho de capital nas vendas de ativos por empresas do Lucro Presumido.

Alguns julgadores entendem que na apuração deve-se levar em conta sim o valor da depreciação, pois o mesmo foi definido no artigo 501 e § 1º do RIR/18 devendo ser aplicado também ao Lucro Presumido.

A Receita Federal também expõem seu entendimento desta forma, conforme podemos ver no Perguntas e Respostas da Pessoa Jurídica – Capítulo XIII – IRPJ – Lucro Presumido 2020, item 24, a saber:

O que vem a ser custo ou valor contábil de bens e direitos, para efeitos de cálculo dos ganhos de capital?
Para fins de apuração dos ganhos de capital, considera-se custo ou valor contábil de bens e direitos o que estiver registrado na escrituração contábil do contribuinte, diminuído, se for o caso, da depreciação, amortização ou exaustão acumulada e das perdas estimadas no valor dos ativos.

Porém existem julgadores que entende de forma diversa. Para estes, não há que se falar em inclusão no cálculo a depreciação acumulada com vistas a apuração do ganho de capital no Lucro Presumido, conquanto neste regime o resultado é obtido de forma pré estabelecida (ficção), não levando em consideração as reais despesas que foram incorridas pelo contribuinte (tanto que o contribuinte pode optar ou não em ter escrituração contábil).

Esse posicionamento foi adotado mais recentemente pelo CARF, nos termos do Acórdão nº 9101-005.436 – CSRF / 1ª Turma, sessão de 10 de maio de 2021, a saber:

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA (IRPJ)
Ano-calendário: 2012
LUCRO PRESUMIDO. GANHO DE CAPITAL. VALOR CONTÁBIL. DEFINIÇÃO.
Para fins de tributação com base no regime de Lucro Presumido a lei não definiu o conceito da expressão “valor contábil” contida no §1º do artigo 521 do RIR/99. Considerada essa circunstância, a expressão matemática do conceito (se custo de aquisição ou custo de aquisição diminuído da depreciação acumulada) deve ser investigada a partir dos elementos que contribuíram para a formação da base de cálculo dos tributos em períodos anteriores, de modo que, se o contribuinte era tributado pelo lucro real e, em razão disso, apropriou ao resultado despesa de depreciação, o valor contábil a ser considerado é o que consta de sua escrituração até o momento imediatamente anterior ao da opção pela tributação com base no Lucro Presumido, isto é, o custo de aquisição diminuído da depreciação acumulada. No caso, entretanto, em que a própria Fiscalização afirma que a contribuinte optou pelo regime de tributação do Lucro Presumido desde o início de suas atividades, seja em virtude de ausência de previsão legal, seja em razão da ausência do cômputo da despesa em períodos anteriores, descabe falar subtração de depreciação acumulada do custo de aquisição na determinação do ganho de capital

Mas qual o impacto que a desconsideração da depreciação acumulada no calculo do ganho de capital no Lucro Presumido pode gerar ao contribuinte?

O impacto pode ser positivo ou negativo, pois depende das variáveis envolvidas na venda do ativo por parte da empresa.

Se considerarmos um cenário mais habitual, onde a maioria dos ativos usados são vendidos por valor inferior ao valor de compra, isso pode ser, teoricamente, benéfico ao contribuinte. Se não vejamos. (cenário com dados hipotéticos)

Um veículo (que era usado em atividades operacionais) adquirido por R$ 500.000,00, que depois de 3 anos de uso vai ser baixado e vendido pela empresa que está no Lucro Presumido, pelo valor de R$ 200.000,00. A considerar os dois entendimentos jurisprudenciais existentes podemos ter os seguintes cenários:

Cenário 1 – Cálculo com depreciação (taxa de 20% ao ano)

Depreciação acumulada: R$ 300.000

Valor contábil: R$ 500.000 – R$ 300.000: R$ 200.000

Valor de Venda: R$ 300.000

Ganho de capital: R$ 300.000 – R$ 200.000: 100.000

Nesse caso houve um ganho de capital de 100.000 que será tributado pelo Fisco.

Cenário 2 – Cálculo sem depreciação

Valor contábil: R$ 500.000

Valor de Venda: R$ 300.000

Ganho de capital: R$ 300.000 – R$ 500.000: -200.000

Nesse caso não existiu ganho de capital e sim um prejuízo, portanto não haverá imposto de renda a pagar.

Observe, no entanto, que as condições para que se efetive a necessidade de pagamento ou não de IR sobre o ganho de capital depende também das condições envolvidas na operação, principalmente do valor de venda. Note que no primeiro exemplo se tivéssemos uma venda de R$ 200.000 o ganho de capital seria anulado.

Portanto mesmo após a escolha de uma ou outra tese, possa ser que, a depender dos valores envolvidos na operação, a mesma seja benéfica ou não ao contribuinte. Porem como ressaltamos, em situações mais habituais, é provável que um ativo depois de usado seja vendido por valor abaixo do valor de custo/compra e, desconsiderando a depreciação acumulada, possa ser que não se apure ganho de capital e sim prejuízo.

Contudo, essa ainda não é o entendimento da Receita Federal (e no CARF esse posicionamento também não é unânime apesar dessa sinalização na Câmara Superior) e o contribuinte deve estar ciente dos riscos de autuações ainda inerentes a escolha pela desconsideração da depreciação acumulada no cálculo do ganho de capital no Lucro Presumido.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *