SOCIEDADE EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO (SCP): REGISTRO DA MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA

A Sociedade em Conta de Participação (SCP) é utilizada para a realização de negócios acidentais e momentâneos, nos quais não há interesse em se constituir uma sociedade empresária com tais finalidades.

O Código Civil – Lei nº 10.406, de 2002, em seus artigos 991 a 996 a seguir reproduzidos, rege a formalidade jurídica da SCP nos seguintes termos:

Art. 991. Na sociedade em conta de participação, a atividade constitutiva do objeto social é exercida unicamente pelo sócio ostensivo, em seu nome individual e sob sua própria e exclusiva responsabilidade, participando os demais dos resultados correspondentes.

Parágrafo único. Obriga-se perante terceiro tão-somente o sócio ostensivo; e, exclusivamente perante este, o sócio participante, nos termos do contrato social.

Art. 992. A constituição da sociedade em conta de participação independe de qualquer formalidade e pode provar-se por todos os meios de direito.

Art. 993. O contrato social produz efeito somente entre os sócios, e a eventual inscrição de seu instrumento em qualquer registro não confere personalidade jurídica à sociedade.

Parágrafo único. Sem prejuízo do direito de fiscalizar a gestão dos negócios sociais, o sócio participante não pode tomar parte nas relações do sócio ostensivo com terceiros, sob pena de responder solidariamente com este pelas obrigações em que intervier.

Art. 994. A contribuição do sócio participante constitui, com a do sócio ostensivo, patrimônio especial, objeto da conta de participação relativa aos negócios sociais.

§ 1º A especialização patrimonial somente produz efeitos em relação aos sócios.

§ 2º A falência do sócio ostensivo acarreta a dissolução da sociedade e a liquidação da respectiva conta, cujo saldo constituirá crédito quirografário.

§ 3º Falindo o sócio participante, o contrato social fica sujeito às normas que regulam os efeitos da falência nos contratos bilaterais do falido.

Art. 995. Salvo estipulação em contrário, o sócio ostensivo não pode admitir novo sócio sem o consentimento expresso dos demais.

Art. 996. Aplica-se à sociedade em conta de participação, subsidiariamente e no que com ela for compatível, o disposto para a sociedade simples, e a sua liquidação rege-se pelas normas relativas à prestação de contas, na forma da lei processual.

Parágrafo único. Havendo mais de um sócio ostensivo, as respectivas contas serão prestadas e julgadas no mesmo processo.

Verifica-se que, embora não personificada, a sociedade em conta de participação é formada por duas ou mais pessoas com identidade de propósitos e qualidades em comum, sendo uma delas qualificado como sócio ostensivo, responsável por praticar todos os atos concernentes ao propósito pelo qual foi instituída a sociedade, e sócio participante, do qual recebe a atribuição de realizar os investimentos necessários para que se torne executável os atos realizados por aquele. Ou seja, a sociedade em conta de participação dever ter objeto social próprio, um empreendedor (chamado de sócio ostensivo que, obrigatoriamente, deve ser uma pessoa jurídica legalmente constituída) e investidor  (chamado de sócio participante).

Fábio Ulhoa Coelho em seu Curso de Direito Comercial (vol.2, 7ª Ed., Saraiva: 2004, pág. 479) com maestria leciona acerca da natureza das SCP nos seguintes termos:

“A conta de participação se constitui da seguinte forma: um empreendedor (chamado sócio ostensivo) associa-se a investidores (os sócios ocultos), para a exploração de uma atividade econômica. O primeiro realiza todos os negócios ligados à atividade, em seu próprio nome, respondendo por eles de forma pessoal e ilimitada. Os agentes econômicos que entabulam negociações com o sócio ostensivo não precisam saber, necessariamente, que a atividade em questão é explorada sob a forma de uma conta de participação. Com os ocultos, o sócio ostensivo tem contrato, pelo qual aqueles são obrigados a prestar determinadas somas, a serem empregadas na empresa, e são, em contrapartida, credores eventuais, por uma parcela dos resultados desta.

Entre os sócios da conta de participação, as contribuições feitas ao empreendimento comum têm a natureza de patrimônio segregado.

A segregação de patrimônio dita por Fábio Ulhoa está diretamente relacionada ao Princípio da Entidade. O Princípio da ENTIDADE reconhece o Patrimônio como objeto da Contabilidade e afirma a autonomia patrimonial, a necessidade da diferenciação de um Patrimônio particular no universo dos patrimônios existentes, independentemente de pertencer a uma pessoa, um conjunto de pessoas, uma sociedade ou instituição de qualquer natureza ou finalidade, com ou sem fins lucrativos.

O cerne do Princípio da ENTIDADE está na autonomia do patrimônio a ela pertencente. O Princípio em exame afirma que o patrimônio deve revestir-se do atributo de autonomia em relação a todos os outros Patrimônios existentes, pertencendo a uma Entidade, no sentido de sujeito suscetível à aquisição de direitos e obrigações. A autonomia tem por corolário o fato de que o patrimônio de uma Entidade jamais pode confundir-se com aqueles dos seus sócios ou proprietários. Por consequência, a Entidade poderá ser desde uma pessoa física, ou qualquer tipo de sociedade, instituição ou mesmo conjuntos de pessoas, …” – Resoluções CFC n°s 750/93 e 774/94 (já revogadas).

Sendo assim, os patrimônios da SCP, da sócia ostensiva (empreendedora – investidora) e dos sócios participantes (investidores) são autônomos, por isso “têm a natureza de patrimônio segregado”.

Conforme já informado em matérias publicadas no site, o Regulamento do Imposto sobre a Renda, aprovado pelo Decreto nº 9.580, de 2018 – RIR/2018, com vigência a partir de 23/11/2018, altera as regras de escrituração das operações realizadas por Sociedade em Conta de Participação – SCP. Nos termos do artigo 269 do RIR/2018, “a escrituração das operações de sociedade em conta de participação deverá ser efetuada em livros próprios“. (O destaque não é do original)

O RIR/1999, aprovado pelo Decreto nº 3.000, de 1999, que foi revogado pelo RIR/2018, em seu artigo 254 estabelecia que:

Art. 254. A escrituração das operações de sociedade em conta de participação poderá, à opção do sócio ostensivo, ser efetuada nos livros deste ou em livros próprios, observando-se o seguinte:

I – quando forem utilizados os livros do sócio ostensivo, os registros contábeis deverão ser feitos de forma a evidenciar os lançamentos referentes à sociedade em conta de participação;

II – os resultados e o lucro real correspondentes à sociedade em conta de participação deverão ser apurados e demonstrados destacadamente dos resultados e do lucro real do sócio ostensivo, ainda que a escrituração seja feita nos mesmos livros;

III – nos documentos relacionados com a atividade da sociedade em conta de participação, o sócio ostensivo deverá fazer constar indicação de modo a permitir identificar sua vinculação com a referida sociedade.

O § 4º do artigo 3º da Instrução Normativa RFB nº 1.774, de 2017, que dispõe sobre a Escrituração Contábil Digital – ECD, diz que, verbis:

§ 4º A Sociedade em Conta de Participação (SCP) enquadrada nas hipóteses de obrigatoriedade de apresentação da ECD deve apresentá-la como livro próprio. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1894, de 16 de maio de 2019)

Do mesmo modo, o § 1º do artigo 1º da Instrução Normativa RFB nº 1.422, de 2013, que dispõe sobre a Escrituração Contábil Fiscal – ECF, diz que, verbis:

§ 1º No caso de pessoas jurídicas que foram sócias ostensivas de Sociedades em Conta de Participação (SCP), a ECF deverá ser transmitida separadamente, para cada SCP, além da transmissão da ECF da sócia ostensiva.“.

Sendo assim, com base na novel legislação do imposto sobre a renda, a partir do ano-calendário de 2018, “a escrituração das operações de sociedade em conta de participação deverá ser efetuada em livros próprios“. (O destaque não é do original)

Portanto, a partir do ano-calendário de 2018, para fins da legislação do imposto sobre a renda e das normas contábeis, a escrituração contábil de SCP deverá ser realizada em livros próprios (da SCP), não mais poderá ser feita nos livros contábeis da sócia ostensiva, conforme era facultado no artigo 254 do revagado RIR/1999.

Vale ressaltar que, com a finalidade de evitar confusão patrimonial, a nossa orientação sempre foi no sentido de a SCP manter contabilidade em separado da contabilidade da sócia ostensiva.

Os valores entregues ou aplicados na SCP, pelos sócios pessoas jurídicas, deverão ser por eles classificados em conta de investimentos no ativo não circulante, de conformidade com o disposto no artigo 179, inciso III, da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, estando sujeitos aos critérios de avaliação pelo método de equivalência patrimonial previsto no artigo 248 da referida Lei nº 6.404, de 1976 e nos artigos 425 e 426 do RIR/2018 (IN SRF nº 179/1987, arts. 6º e 7º).

Os valores entregues pelos sócios, pessoas jurídicas, somados aos valores entregues pelos sócios, pessoas físicas, constituirão o capital da SCP, que será registrado em conta que represente o patrimônio líquido desta (IN SRF nº 179/1987, art. 6º, item 1).

Nos documentos relacionados com a atividade da SCP a sócia ostensiva deverá fazer constar indicação de modo a permitir identificar sua vinculação com a referida sociedade (IN SRF nº 179/1987, art. 3º, item 3). Note que, não obstante a obrigatoriedade da inscrição no CNPJ, a SCP por não ter personalidade jurídica, mesmo que com CNPJ não pode abrir contas bancárias. As contas bancárias para a movimentação financeira da SCP, de forma individualizada, devem ser abertas em nome da sócia ostensiva, observando a segregação de patrimônio (Princípio da Entidade).

Para exemplificação de registros contábeis na SCP, na sócia ostensiva e em sócia participante, admita-se que as empresas “A” e “B” resolveram constituir uma SCP para determinado negócio que exige um investimento inicial de R$ 500.000,00 de cada uma. Entabularam o instrumento particular de contrato de constituição da SCP, denominada de “Empresa B – SCP“, com capital social de R$ 1.000.000,00 e elegeram a empresa “B” como sendo a sócia ostensiva. Também foi pactuado que o capital social subscrito deverá ser integralizado no ato da assinatura do contrato, mediante depósito em conta corrente de depósitos à vista, que será aberta em uma agência do Banco Alfa pela “Empresa B – SCP”.

Na SCP (Empresa B – SCP) os registros contábeis, em livro próprio, de subscrição de capital social deverão ser realizados mediante os seguintes lançamentos contábeis:

Pela subscrição de capital social:

D – Capital Social a Integralizar (PL): R$ 1.000.000,00
C – Capital Social ( PL): R$ 1.000.000,00

Pela integralização das cotas de capital social subscritas pelas empresas A e B:

D – Bancos Conta Movimento – Banco Alfa – “CC Empresa B – SCP” (AC): R$ 500.000,00
D – Bancos Conta Movimento – Banco Alfa – “CC Empresa B – SCP” (AC): R$ 500.000,00
C – Capital Social a Integralizar (PL): R$ 1.000.000,00

Na empresa “A”, o registro contábil do investimento na SCP deverá ser realizado mediante o seguinte lançamento contábil:

D – Investimentos – Participação Societária na “Empresa B – SCP” (ANC): R$ 500.000,00
C – Bancos Conta Movimento (AC): R$ 500.000,00

Na empresa “B”, o registro contábil do investimento na SCP deverá ser realizado mediante o seguinte lançamento contábil:

D – Investimentos – Participação Societária na “Empresa B – SCP” (ANC): R$ 500.000,00
C – Bancos Conta Movimento (AC): R$ 500.000,00

9 comentários sobre “SOCIEDADE EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO (SCP): REGISTRO DA MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA

    1. Bom dia!! Obrigado por ter entrado em contato com Ideiativa.
      Voce tera’uma inscrição para cada SCP mantendo a escrituraçao centralizada na sociedade ostensiva.

  1. Amigo, tenho uma pergunta: Tenho uma PJ e 3 PF que decidiram explorar um empreendimento imobiliário. O que deve ser feito quanto a, questão da SCP, tenho que abrir um CNPJ para cada sócio ou, abrir um CNPJ constando os quatro pessoas como sócia.

    1. Obrigado por ter acessado nossa pagina na internet
      Para dirimir sua duvida vou tentar esclarecer com as informações passadas em seu e.mail, mas sugiro que entre em contato conosco para uma melhor avaliação.
      Inicialmente porque optar pela SCP ?
      Mas sendo esta opção vocês efetuariam a abertura de um único CNPJ para esta SCP constante a sociedade empresaria ja existente como ostensiva e os demais como sócios participantes.
      Estamos aptos a oferecer a vocês uma assessoria de qualidade, entre em contato conosco.

  2. a empresa acabou ficando com todo o meu dinheiro e não repassa mais os lucros e não devolve o valor aportado inicialmente … como faço para processar? que termos judiciais utilizo para relação entre sócio contratado e spcio contrtatante????

    1. Bom dia!
      Obrigado por ter acessado nossa materia.
      Para uma informação mais acertiva precisariamos ter acesso aos documentos firmados para a constituiçao desta sociedade.

  3. Valter boa tarde. Para pagar os sócios investidores a SCP tem que ter lucro ou posso pagar esse retorno de investimento com a empresa do socio ostensivo? Assisti um curso agora que falava que a SCP tem que ter lucro para pagar os investidores. Fiquei confuso com isso

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